Dose dupla

José Horta Manzano

Dia destes, o Estadão online deslizou em dose dupla. Foram duas chamadas superpostas, logo na primeira página.

Pré-sal caipira
Há que martelar quando está errado. Mas também há que elogiar quando está correto. Pré-sal caipira foi uma tirada excelente. Gosto de ver quando dão a cada coisa o nome certo. Caipira, forma tradicional, diz o que tem que ser dito. Alguns, acreditando que a palavra possa ser ofensiva, preferem ‘sertanejo’. É modismo. Sertanista era o marechal Rondon, que passou boa parte da vida embrenhado na mata.

Pamonha caipira, festa caipira, tutu de feijão à moda caipira.
Onde está a ofensa?

Já imaginaram «pré-sal sertanejo»? Fica fora de esquadro.

Bom, voltemos à chamada. O «cocô de porco» não me agradou. Não que seja agressivo; o problema é que a palavra ‘cocô’ pertence ao vocabulário infantil. Em primeira página de jornal, não cai bem. Há meia dúzia de palavras que dão o recado sem descambar para nenhum linguajar chulo ou infantil: dejetos, excremento, esterco, fezes, dejeção.

Prefeito de SP
Dá pena ver o prefeito de SP, moço tão jovem, castigado por enfermidade tão pesada. Que se restabeleça rápido!

Na frase: «Câncer em Covas reduz após tratamento e prefeito fará biópsia», o estagiário cochilou duas vezes.

Primeiro
Não é “câncer em Covas”, mas “câncer de Covas”. Estivéssemos escrevendo em latim, ‘Covas’ iria para o genitivo.

Segundo
Aqui é mais grave. O verbo reduzir só é intransitivo no sentido de reduzir (a marcha de) um veículo (= engatar uma reduzida). Fora isso, é sempre transitivo, isto é, exige objeto ou pronome reflexivo.

«Câncer de Covas reduz» desrespeita a norma culta. Falta aí um pronome reflexivo. Depurada e polida, a frase fica em dois pedaços:

«Câncer de Covas reduz-se após tratamento. Prefeito fará biópsia»
ou
«Câncer de Covas se reduz após tratamento. Prefeito fará biópsia»

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